
As férias haviam acabado há alguns dias, mas eu ainda estava em casa. Consegui convencer minha mãe de que estava com alguma virose mas eu sabia que logo ela perceberia e eu teria que ir pra escola. Eu não queria encarar aquela situação, depois da Lívia saber de tudo o que eu sentia por ela. Eu conheço bem as garotas. Elas sempre têm melhores amigas que tem melhores amigas e por ai vai. Com certeza toda a sala sabia do ocorrido. Bem, não havia mais nada a fazer a não ser ir para escola.
O Mário havia guardado um lugar para mim perto dele e cada passo meu ao entrar na sala era seguido de um comentário: “Shakespeare apaixonado”, “Lá vem o negão cheio de paixão”, “Viado”. Falem bem ou falem mal o que importa é que estão falando... Ditado estúpido!
Fui me sentar e dei uma boa olhada na sala. Havia rostos novos e muita gente da antiga turma 135. Estava lá agora a 235. Na carteira atrás de mim havia um cara chamado Tiago, repetente gordinho e tinha algo que um dia se tornaria um bigode.
Ele me chamou e disse:
O Mário havia guardado um lugar para mim perto dele e cada passo meu ao entrar na sala era seguido de um comentário: “Shakespeare apaixonado”, “Lá vem o negão cheio de paixão”, “Viado”. Falem bem ou falem mal o que importa é que estão falando... Ditado estúpido!
Fui me sentar e dei uma boa olhada na sala. Havia rostos novos e muita gente da antiga turma 135. Estava lá agora a 235. Na carteira atrás de mim havia um cara chamado Tiago, repetente gordinho e tinha algo que um dia se tornaria um bigode.
Ele me chamou e disse:
-Você é o William?
-Sim.
-Hahahahahaha!
-Do que esta rindo?
-Cara, você não pode mandar cartas você tem que chegar de jeito sacou?
Meu Deus quem não tinha conhecimento do ocorrido? E o que é chegar de jeito?
-Não saquei não.
-Chegar de jeito cara você sabe.
-Não eu não sei.
Por que as pessoas insistem em querer ensinar coisas que não compreendem?
-Eu vou te mostrar. Me observe ainda nessa semana eu te mostro.
Mal se passaram dois dias e via ele conversar sempre com a mesma garota durante o recreio, e então entre uma conversa e outra ele foi se aproximando e a beijou. Apesar dele ser bem feio a situação tinha melhor aparência de que quando vi o Ladislau beijar a Ana Paula (no texto "Ainda no ponto de ônibus").
O Tiago parecia saber o que estava fazendo e eu sabia que eu não saberia fazer aquilo. Essa era a verdade. E então algo me ocorreu: e se eu fosse conhecido, fosse popular, será que seria mais fácil? Será que assim minhas chances seriam razoáveis? Por que não tentar? Mas o que um garoto de 11 anos poderia fazer? Não sendo bom o suficiente nos esportes, não sendo sequer bonito e nem intimidador? Coloquei em prática uma idéia absurda. Já que a carta que mandei para Lívia causou tanta repercussão resolvi enviar mais cartas, não para a Lívia, mas sim para outras garotas. Logo descobri outra coisa sobre mulheres: elas competem por qualquer coisa.
Eram apenas cartas que não diziam nada apenas palavras avulsas e foi necessário apenas três. Enviei para a Pollyanna amiga da Lívia, outra para a Grace a garota bruxa e outra para uma garota chamada Stéfanie. Garotas de grupos diferentes.
Então a maioria das garotas começaram a questionar por que não ganharam cartas e logo meu nome não saia da boca delas. Diziam que eu era legal, que as compreendia. Me chamavam pra fazer trabalhos com elas, traziam lanches para mim, me apresentavam à garotas e questionavam quem eu gostaria de namorar, e bem, a resposta sempre a mesma: Lívia. Alguns garotos que eu não conhecia chegavam de vez em vez para dizer:
-Você podia me apresentar aquela garota parceiro?!
Nada disso adiantou. A verdade é que a Lívia parecia mais distante. O Mário me chamou na aula de história e disse:
-Por que você não conversa com a Lívia?
-E dizer o que? Que gosto dela?
-... É.
O Mário não compreendia as coisas. Eu não podia simplesmente chegar e dizer o que sentia. Eu via filmes, seriados e até mesmos nos livros, sempre o homem tem algo a oferecer. Mas enquanto a mim nada tinha a oferecer. Qual a minha relevância naquele meio? A verdade é que eu não era ninguém. Percebi que convivi com pessoas muito populares como o Aloísio e o Marcelo e eles tinham algo que me faltava, e esse algo era um grupo. Sempre havia pessoas com eles os ouvindo ou somente andando. Somente o Mário andava comigo e o Mateus falava sobre desenhos. Precisava de reforço.
Nesse momento percebi a presença de alguém na sala. Há quanto tempo ele estava ali? O cara parecia uma máquina, sempre estava estudando. Nunca o vi falar com ninguém ou praticar algum esporte. Sempre lá estudando. Sentava exatamente no meio da sala. Perguntei ao Mateus o nome dele (Mateus sabia o nome de todos, ele se desenvolveu bem na arte da política na escola). Se chamava Lucas. No fim da aula fui conversar com ele, havia ainda algumas garotas na sala e o Mário me esperava na porta.
- E ai?
-...
-Lucas não é?
-...
Qual o problema desse cara? Será que era mudo ou especial? Fiquei lá e tentei, mas nada veio dele nem um olhar de reprovação, era como se eu não existisse. O Mário gritou da porta:
- Eu tenho que ir William, a Stela vai fechar a biblioteca!
-Aquela mulher parece um cachorro velho e você o Carlton! (primo do Will no seriado Um Maluco No Pedaço)
Gritei para o Mário isso e vi o Lucas rir. Então eu disse:
-Te vejo amanhã.
-Amanhã não tem aula.
O senso de humor se fora assim como veio e a sua voz era fria e objetiva. Respondi:
-Eu disse... Nos vemos na segunda-feira.
-Sim.
-Hahahahahaha!
-Do que esta rindo?
-Cara, você não pode mandar cartas você tem que chegar de jeito sacou?
Meu Deus quem não tinha conhecimento do ocorrido? E o que é chegar de jeito?
-Não saquei não.
-Chegar de jeito cara você sabe.
-Não eu não sei.
Por que as pessoas insistem em querer ensinar coisas que não compreendem?
-Eu vou te mostrar. Me observe ainda nessa semana eu te mostro.
Mal se passaram dois dias e via ele conversar sempre com a mesma garota durante o recreio, e então entre uma conversa e outra ele foi se aproximando e a beijou. Apesar dele ser bem feio a situação tinha melhor aparência de que quando vi o Ladislau beijar a Ana Paula (no texto "Ainda no ponto de ônibus").
O Tiago parecia saber o que estava fazendo e eu sabia que eu não saberia fazer aquilo. Essa era a verdade. E então algo me ocorreu: e se eu fosse conhecido, fosse popular, será que seria mais fácil? Será que assim minhas chances seriam razoáveis? Por que não tentar? Mas o que um garoto de 11 anos poderia fazer? Não sendo bom o suficiente nos esportes, não sendo sequer bonito e nem intimidador? Coloquei em prática uma idéia absurda. Já que a carta que mandei para Lívia causou tanta repercussão resolvi enviar mais cartas, não para a Lívia, mas sim para outras garotas. Logo descobri outra coisa sobre mulheres: elas competem por qualquer coisa.
Eram apenas cartas que não diziam nada apenas palavras avulsas e foi necessário apenas três. Enviei para a Pollyanna amiga da Lívia, outra para a Grace a garota bruxa e outra para uma garota chamada Stéfanie. Garotas de grupos diferentes.
Então a maioria das garotas começaram a questionar por que não ganharam cartas e logo meu nome não saia da boca delas. Diziam que eu era legal, que as compreendia. Me chamavam pra fazer trabalhos com elas, traziam lanches para mim, me apresentavam à garotas e questionavam quem eu gostaria de namorar, e bem, a resposta sempre a mesma: Lívia. Alguns garotos que eu não conhecia chegavam de vez em vez para dizer:
-Você podia me apresentar aquela garota parceiro?!
Nada disso adiantou. A verdade é que a Lívia parecia mais distante. O Mário me chamou na aula de história e disse:
-Por que você não conversa com a Lívia?
-E dizer o que? Que gosto dela?
-... É.
O Mário não compreendia as coisas. Eu não podia simplesmente chegar e dizer o que sentia. Eu via filmes, seriados e até mesmos nos livros, sempre o homem tem algo a oferecer. Mas enquanto a mim nada tinha a oferecer. Qual a minha relevância naquele meio? A verdade é que eu não era ninguém. Percebi que convivi com pessoas muito populares como o Aloísio e o Marcelo e eles tinham algo que me faltava, e esse algo era um grupo. Sempre havia pessoas com eles os ouvindo ou somente andando. Somente o Mário andava comigo e o Mateus falava sobre desenhos. Precisava de reforço.
Nesse momento percebi a presença de alguém na sala. Há quanto tempo ele estava ali? O cara parecia uma máquina, sempre estava estudando. Nunca o vi falar com ninguém ou praticar algum esporte. Sempre lá estudando. Sentava exatamente no meio da sala. Perguntei ao Mateus o nome dele (Mateus sabia o nome de todos, ele se desenvolveu bem na arte da política na escola). Se chamava Lucas. No fim da aula fui conversar com ele, havia ainda algumas garotas na sala e o Mário me esperava na porta.
- E ai?
-...
-Lucas não é?
-...
Qual o problema desse cara? Será que era mudo ou especial? Fiquei lá e tentei, mas nada veio dele nem um olhar de reprovação, era como se eu não existisse. O Mário gritou da porta:
- Eu tenho que ir William, a Stela vai fechar a biblioteca!
-Aquela mulher parece um cachorro velho e você o Carlton! (primo do Will no seriado Um Maluco No Pedaço)
Gritei para o Mário isso e vi o Lucas rir. Então eu disse:
-Te vejo amanhã.
-Amanhã não tem aula.
O senso de humor se fora assim como veio e a sua voz era fria e objetiva. Respondi:
-Eu disse... Nos vemos na segunda-feira.